sexta-feira, 24 de fevereiro de 2017

Estamos intoxicados

Pouco se sabe sobre as consequências de dormir pouco. Esta é uma mudança muito recente na História humana. Deixámos de viver de sol a sol e artificializámos as nossas vidas com a ajuda da luz, da televisão e, mais recentemente, dos smartphones. “Que importa? Durmo no fim de semana!” A entrevista com a doutora Paula Rosa (páginas 22 a 25 da gira de fevereiro) é um importante alerta para este tema mas, também, oportunidade para analisar o cenário geral. Não estará a modernidade a conduzir as nossas vidas para um ponto de não retorno? Sobrinho Simões, da Associação Portuguesa de Investigação em Cancro, afirmou, recentemente, que a partir de 2050 metade dos portugueses vai morrer de cancro. Também a Organização Mundial de Saúde afirma que os casos de demência, entre os quais a doença de Alzheimer, deverão aumentar progressivamente nos próximos anos. Os ataques cardíacos também são em maior número e a diabetes sobe em flecha. Não seria de esperar que, com a evolução da medicina e maior informação, os seres humanos tivessem mais qualidade de vida? Ou será que confiamos demasiado no progresso? Conduzimos carros que poluem o ar, ingerimos comida inundada de químicos com nomes que nem sabemos pronunciar, sorvemos bebidas que nos entopem as veias, abusamos do telemóvel que nos estraga a vista, apanhamos sol em excesso que nos arruína a pele e deixamos de dormir para podermos ver a telenovela preferida. E tudo para quê? Seria de esperar que, com cada vez melhor informação, tomássemos decisões mais conscientes e saudáveis. Parece, porém, que é o contrário. O sono é mais um desses terrenos desconhecidos. Tal como os organismos geneticamente modificados (OGM), que já fazem parte da nossa alimentação e dos quais se tem suspeitas que possam prejudicar a saúde. Há poucos estudos sobre as consequências da má higiene do sono. No passado, a PIDE privava alguns prisioneiros de dormir como forma de tortura. O recorde foi de um engenheiro que, ao fim de um mês, se suicidou. Consegues imaginar o desgaste psicológico e emocional? Agora, imagina anos a fio a comer mal, a dormir mal, a levarmos vidas artificiais. Seremos tão sãos como imaginamos?
*diretor da Revista gira

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